quinta-feira, agosto 30, 2007

Titia





Minha família por parte de mãe é feita de mulheres. Na verdade não sei de nenhuma figura masculina forte.
Vou contar de uma figura que mesmo não a tendo conhecido marcou minha infância e é guardada no meu coração pra contar pra quem quiser ouvir ou me ler.
Titia seu nome de nascimento; Maria José, só há algum tempo minha mãe me disse seu nome. Para todos, simplesmente titia.
Sim, talvez até porque não tenha se casado, ficou para titia.
Mas não uma titia recalcada que guarda mágoas por ser só, ou estar só. Na verdade pelo o que minha mãe conta, nunca, nunca esteve só. Amou àqueles que estavam a seu redor até sua morte, prometendo inclusive, amar após a morte, explico mais adiante.
Era uma figura miudinha, magrinha, que era possível de ser carregada pela criançada na “cacunda”, para atravessar o córrego. A criançada lá na roça na sua algazarra a pegava nas costas para atravessar o riacho e lá ia ela gritando de medo.
Morava com sua irmã a forte Ana.
Uma de suas tarefas era acompanhar minha avó, filha de Ana nos bailes. Titia nem sempre estava com vontade de ir, minha avó geniosa que só, uma vez jogou uma espiga de milho na sua testa e o sangue escorreu, mas calou-se, mágoa, não existia no vocabulário dela.
Devota que era, todas as tardes colocava seu banquinho no terreiro, o sol se pondo, montanhas de Minas Gerais, seu rosário nas mãos. Ah, titia, quantas preces!
Quando estava adoentada, olhava para minha mãe e dizia “ô minha filha o que vai ser de você e sua mãe, depois que eu me for”. Minha mãe, chorosa, já que titia várias vezes a defendeu das surras da tia em que minha mãe morava para poder estudar, lhe dizia “titia, você vem me buscar”. Ela prometia, “venho minha filha”. Ah, titia, só seu coração puro para prometer isso.
Seu sangue, foi, foi, e como passarinho voou para o céu.
Seu caixão branquinho, roupa branca, manto azul, como o da Virgem Maria. À noite, minha mãe com medo lhe pediu, titia, não vem me buscar não.
Contou-me também que uma noite depois de ter apanhado muito e dormido chorando, sonhou com titia e seu manto azul e ela lhe dizia que ela iria tirar ela de lá. No outro dia, minha mãe saía de lá para trabalhar como empregada em outra casa. Surras não mais. Ê titia, amor assim até depois da morte.
Por essas histórias, eu menina de uns oito anos, sempre que ia com minha avó ao cemitério em Minas visitar o túmulo de D. Ana, eu sempre perguntava para minha avó onde estava a titia, ela dizia, que na época não tiveram dinheiro para comprar um túmulo, em que tivesse registrado seu nome, então foi enterrada na terra, direto, mas eu não me contentava, queria deixar minha flor para ela e minha vó entrava na minha “criancice” e me mostrava mais ou menos onde era e então eu lá deixava minha flor.Mas bem sabia onde estava e está ela, no céu, no meu coração!

Um comentário:

Anônimo disse...

"Titia" é um exemplo de vida!

Beijos,
Thais